domingo, 18 de janeiro de 2009

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Certo que ao menos o céu traria uma luz, sentou. Eram daquelas esperanças que, desesperadamente, resolvem insurgir nas sobras do que um dia se pôde chamar de fé. Talvez seja apenas outra forma de fé; a última. Nem nuvens passavam para ver aquele cidadão sentado em uma pedra, catando restos de sombras de um arbusto que, pelado, fazia mais caminho ao sol que sombra. Desenhando o nada num chão com um galho, levantava a poeira da terra seca e vermelha que servia de tapete pro seu caminho. E nesse risca-risca aleatório, Josval começa a desenhar seguidos ‘éles’; continuou assim até pensar no nome que iniciava com aquela letra. Com um ar vencido, apoiou com um dos braços a cabeça e o outro deixou arriado, ambos escorados pela coxa. Tentou fugir do risco que estava não só no chão, mas em seus olhos: - esperar é fazer engorda pra Morte. Mas não adiantava pensar assim se o corpo já não saía de perto do risco no barro. A estrada só tinha um caminho agora, mas esse caminho era pra longe; voltar não poderia, apesar de querer exatamente isso. Enfrentava todo ano aquele sol, aquela terra morta, aquele céu seco, sem arquear – não tinha natureza pra isso. Onde ele pisava, sabia se virar. Mas aquela marca no chão ele não pisou; era chão, mas não era terra que homem conhecia. Por isso, procurava outros cantos para seu arrumo. Era capiau; qualquer terra era trabalho. Saía de uma onde se ajeitara, mas naquele chão ele não conseguia plantar – não era terra que podia pisar. Amanhou como pôde, deu sua força, mas aquela terra não seria dele. Se era de alguém ou de ninguém, pouco interessava Josval; era ele o sem-terra. Como ficar em terra em que se planta e nada brota?
Voltou a olhar o céu. Agora, em pé, Josval bateu com o chapéu de couro na roupa avermelhada, tomou suas trouxas, largadas ao lado da pedra servida de assento, e tocou para o caminho que poderia levá-lo para alguma boa terra, que pudesse colher algo de verdade pra sua simples vida de sertanejo.



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