“Amanhã recomeço.”
Carlos Drummond de Andrade, em O elefante.
Carlos Drummond de Andrade, em O elefante.
Riscada na fronte gasta,
a escassez do borrado sorrir
pela longa e só jornada.
Vermelha, a vergonha pintada
no nariz, de estranha forma,
recuando de olhares cinzas.
Amassado nas simples vestes,
dobra-se, na recusa de poder,
no bolso esquecido da sua vontade.
Os cabelos, enrolados no inusitado,
desagradavam a ordem no desgrenho.
E o pente ria ridículos com dentes quebrados.
Os pés amarrados no sapato velho,
enterrados na poeira dos dias vagos,
e desfeitos do brilho dos saltos vivos.
Mãos grandes, desastradas, caíam nas coxas,
por perdidas estarem no O-que-agarrar?,
ritmando o olhar vagante e vazio a girar.
Sentado na longa estrada, espera. Espera.
Sonhando o maior truque, último,
guardado num pequenino bolso, discreto:
vasculhando o interior do paletó, acha,
roto e esgotado, um antigo estojo,
com seus lápis e pincéis de rosto.
Com mãos seguras, limpa do velho rosto
a seca tinta que descascava em silêncios.
Despido de restos, olha o estojo, iluminado.
Pinta a ida a um Onde?, mapeado nos traços
do arco-íris a agora emoldurar uma face que,
tímida, esboça um sorriso, amarelo. Áureo.
E assim desenha-se, rascunhando felicidades.
O toque leve do pincel traz caretas e risos
e um vermelho outro aponta no grande nariz.
Sentado ainda, olha, com olhos de infância,
o imenso vasto que o envolve. Então levanta
e move-se, seguindo para seu destino. Pulando.