Espantado, olho ao lado do meu corpo
o denso Vazio que fumava meu sorriso.
Era a noite, mal-educada, que tocava
em mim a ausência, gargalhando aquilo
que eu trancava em meus dias.
E quanta arrogância no seu rosto,
que me acordava aos sustos, cuspindo
desesperanças e velhos espelhos,
enquanto, fraco e surdo, encaro-o,
deportado da brandura que me iluminava.
Tirando o cigarro da boca, pôs-se
em minha frente – rígido.
Travou meus passos, apontando os olhos
para minha fatigada face.
Estáticos. Silêncios. Frio.
Do nada feito, porém rei na longa noite,
o Vazio expandiu-se, a confundir-se
com o Universo. Postes, luzes e estrelas,
engolidas pela fome negra, apagaram-se.
A noite não devorou meu tremor e meu frio,
para marcar-me a memória do que ela deixou,
do que me levou. Do que eu a deixei levar.
E minhas mãos, a agarrar lágrimas e desesperos,
confundiam-se com a noite, em meu rosto coberto –
de dor, vergonha
e medo.
Estava só. Nem alma ou redenção surgiam.
(Depois do terceiro dia restaria apenas cinzas
do cigarro. De mim.)
Estava só. Tocando o etéreo da esperança
que pousava em meus ombros em tinta falsa,
escorrendo de um urubu.
Queria gritar, destemperado,
enlouquecido pela fúria!
Xingar os céus mentirosos,
pintados de azul para rir por dentro
o vácuo de nossa insignificância!
Queria esmurrar a dor,
fazê-la doer mais e mais,
até meu sangue lavá-la,
tal pecador a barganhar paraísos
com deuses mesquinhos.
Mas estava só.
E até meu coração – mudo – foi-se,
deixando-me o eco do que um dia sorri
no Vazio do mundo a me digerir.