terça-feira, 8 de julho de 2008

Fim do Ranger




E tinha certo cuidado, como tudo aquilo que possuía valor. Esse ‘tudo aquilo’, na verdade, não passava de uma coisa só. Talvez não valesse nem uma moeda velha, mas para aquele velho solitário, era o que o mantinha vivo. Os anos passaram depressa; a velha cadeira de balanço já rangia seu fim. Nela, apenas viu acenos. Vários acenos. Os que se sentavam ao lado (havia esses?), nem um balanço deram. O vai-e-vem do assento ia, lentamente, acompanhando o tempo do velho. Aquilo que ele tanto cuidava era o que sacolejava a velha cadeira. Se mais alguém fez isso? O velho não acreditava. Era sozinho: nisso sim ele tinha fé. E bastava. Balanços de mãos distantes não chegavam à cadeira.

E assim sua vida seguia. Nada mais a esperar, apenas o sossego da cadeira.
E o que era o fiel enigma do velho? Ele praticamente não diz. E não adianta o pouco que se ouve: ninguém entende. O velho apenas murmura: ‘algo empurra balança esta cadeira’. Vida estranha a desse velho... Olhar, sozinho e sentado em um amontoado de madeira velha, o mundo passar. Nunca se levantou! Comentários feitos pelos outros que, chegando aos ouvidos do senhor, faziam com que ele mostrasse um triste sorriso. ‘As mãos continuarão distantes. Elas não balançarão minha cadeira; me empurrarão ao chão’. Dizendo isso, o velho apertava ainda mais o misterioso objeto que ele tinha. As juntas da cadeira de balanço soltavam sons mais fortes. Se é dor, se é medo, se é felicidade, não há como saber. O som não se entende com os ouvidos. Nessas horas de rangidos, o velho fechava os olhos, apagando a luz da realidade trazida nas mãos de aceno. Era quando o velho sorria. Raramente.

Era isso que fazia com que o velho teimasse a deixar que o balanço cesse. Sozinho está, sozinho ficará, apenas com a companhia do desconhecido objeto. O velho olhou demoradamente para ele. Derramou uma única lágrima em cima daquela misteriosa matéria e, como se antes não existisse, ela sumiu das mãos do ancião. Mas ele não parecia se importar; já esperava que isso acontecesse algum dia. O balanço lentamente parava seu vai-e-vem. Os rangidos não se escutavam mais. O velho então colocou seus pés no chão. Sua antiga e triste feição voltou ao rosto. Sem sair da cadeira, seus olhos se fecharam.







Uma mão vinha levantá-lo. Aquilo que antes ninguém sabia o que o velho escondia agora era luz. Uma luz branca, que o engolia. O sorriso tomava conta de seu rosto. O balanço ficou para trás, mas seus pés não mais tocariam o chão.




Não costumo escrever para alguém. Mas certas pessoas merecem (até mais do que algumas linhas).




2 comentários:

  1. sempre gostei de balanço...
    me apeguei a cadeira sem nem perceber...mas sempre soube bem o rangido que fazia...e ainda assim não conseguia levantar, ficava parada, ouvindo a vida seguir a passos pesados, e me perguntando quando viriam me buscar...

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